segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Adolescentes no Orkut fazem do autorretrato um modo de vida


"Nunca fui muito de tirar foto", diz Igor Belchior, 16 anos, quatro perfis lotados no Orkut e uma comunidade que congrega 54 páginas "fake" da sua pessoa.

Igor ficou famoso na internet por seus autorretratos. Seja de boné de aba reta, óculos de aro grosso ou de lente azul no olho, só tira fotos de si mesmo --foram mais de 300. Começou ao desfiar o cabelo e não parou mais, por causa de elogios.

"Cara, invejo suas fotos", diz Nathália Lima, por "testimonial". "Ele é perfeito! As fotos dele são muuuito demais", depõe por MSN Lívia Carbol, 14, que não o conhece ao vivo.

Hoje, ele só tem 24 fotos na rede, mas atrai um novo "amigo" por dia. Por que Igor produz esses chamarizes e por que as pessoas os procuram?

Ele diz não saber, mas a antropóloga Carmen Rial diz que "essa geração tem câmera digital e a usa como espelho. Olham-se nas fotos e também olham para o outro, para descobrir quem são."

Coordenadora do Núcleo de Antropologia Audiovisual e Estudos da Imagem da Universidade Federal de Santa Catarina, Rial diz que nunca a imagem foi tão importante para fazer parte de grupos.

"A foto de si serve para dizer "estive lá", ou "estive com eles"."

Moldura

Kiany Caprera, 15, diz que seu rosto ocupa a maior parte dos álbuns de viagem.

"É que a gente emoldura a paisagem, e assim qualquer coisa fica mais bonita", explica.

Por "a gente", fala de um grupo de pessoas que "sabem tirar autorretrato". "Não são todos."

Ela faz parte de uma comunidade de Orkut na qual só são admitidos usuários "especiais".

"Gente bonita, sabe?" Foi convidada a entrar por causa da cara que se deu, com ajuda de "um pouquinho de Photo- shop", nas 120 fotos do perfil.

Mas Kiany admite que imagem pode não ser tudo e que "fotos não importam tanto".

"É comum dizer que as fotos não importam", diz o aluno de ciências sociais da USP Eduardo Garcia, que estuda o uso de foto em redes sociais.

Garcia diz que, mesmo gastando horas nas fotos e fazendo legítimos "books" com os braços esticados, teens fingem que as fotos são espontâneas.

Carlos Moreno, 18, não finge. "É óbvio que estufo o peito e sorrio de boca fechada, para não aparecer o aparelho!"

Para Moreno, uma boa "autofoto" é "chance de conhecer gente que não te olharia na rua", e uma boa câmera vale o investimento que for em dinheiro.

Ou em presente. Nathália Pacheco, 15, espera pela chegada do Papai Noel para aprimorar a técnica. Pediu de Natal uma câmera semi-profissional, para "se fotografar em todo lugar".

Arte da "autofoto"

A mania de "fincar a bandeira", fotografando-se em qualquer lugar, pode incomodar.

"É um saco! Atrapalha quem quer ver o que está exposto, em vez de se ver com o que está exposto", diz um monitor do Museu da Língua Portuguesa, no centro de São Paulo.

No museu Louvre, em Paris, câmeras também são muitas, mas não um problema.

"A gente deixa. É um jeito de o jovem interagir com a arte e se apropriar dela, por mais que a gente não entenda", diz Didier Arnaud, monitor da sala onde fica a "Monalisa", que pode ser um autorretrato.

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